Filosofia e sistemas naturais: observar a natureza cura as dúvidas existenciais - OPINIÃO 07/03/2025
- Ana Cunha-Busch
- 6 de mar.
- 4 min de leitura

Filosofia e sistemas naturais: observar a natureza cura as dúvidas existenciais
Para aqueles que têm refletido sobre a dor e o sofrimento inerentes à vida, devo dizer aos senhores que a natureza oferece respostas para aqueles que a observam. Esses dias, quando estava alimentando minhas galinhas, vi naquela comunidade uma reprodução perfeita de como os seres humanos se relacionam entre si. Cada um querendo encher sua própria boca primeiro. E a galinha diferente, que chegou por último, continua, apesar da passagem do tempo, a ser bicada quando tenta abrir espaço para si mesma durante a alimentação. Apesar de não ser reconhecida e humilhada por seus colegas, ela demonstra mais habilidades de sobrevivência e foi a primeira a se refugiar da chuva para chocar um pintinho no verão passado, o que a salvou de um forte resfriado.
Cobras venenosas, escorpiões e lacraias desapareceram aqui depois que a vida se estabilizou de forma mais equilibrada. Não há misticismo aqui, mas sim anos de observação. As pragas e infestações mudaram: no primeiro ano, após a estação chuvosa, muitos vermes. No segundo ano, muitos grilos. No sétimo ano, a surpresa foi a visita de muitos sapos após a primavera. E assim que as sementes plantadas se transformaram em árvores adultas com seus pequenos frutos, o número de pássaros caiu drasticamente.
Qualquer pessoa que observe a ecologia e tenha estudado permacultura sabe que os sistemas naturais são perfeitos em sua complexidade e são compostos por um conjunto de elementos em constante relacionamento. Tudo está emaranhado e influencia todos os resultados. Cada pequena ação ou interferência pode gerar efeitos em cadeia, mas, como acontece com qualquer organismo ou sistema, as relações de causa e consequência obedecem a uma lógica não linear, semelhante a uma rede, na qual muitos elementos se influenciam mutuamente para gerar um resultado.
Isso não é verdade também para as doenças do corpo humano? A genética, os hábitos alimentares, o estilo de vida sedentário, o ambiente social, o estresse e o clima da mente estão todos juntos e nenhum deles pode ser considerado isoladamente para definir a causa de um diagnóstico.
Como os cientistas costumavam dizer, “Deus não joga dados”. E observar a natureza é a chave para entender como funciona essa inteligência que criou as coisas do mundo. A observação funciona para deduzir e a dedução também é o método científico. Deduzir que a criação do universo não é aleatória, que existe uma inteligência que organizou a natureza, caso contrário não haveria padrões, repetições, formas, mas apenas caos e aleatoriedade.
Observar e interagir é o primeiro princípio da permacultura, um método criado pelos australianos Bill Mollison e David Holmgren para que os seres humanos possam “permanecer” em vez de se autodestruírem. Para aqueles que não acreditam que a autodestruição humana seja possível, os senhores podem viajar para o Saara e contemplar o deserto.
Há evidências de que animais de grande porte viviam no Saara, assim como vivem hoje em outras partes da África. Fósseis de crocodilos, elefantes, gnus e peixes provam que havia vegetação e água para sobreviver. É também o berço das primeiras civilizações e dos primeiros experimentos de domesticação e pastoreio de animais.
Como Allan Savory nos ensina sobre sistemas naturais, grandes rebanhos nômades sustentam as prósperas savanas, já que a vegetação gramínea é revigorada pela poda e pelo pastoreio dos animais e também se beneficia do esterco e da urina que os rebanhos deixam para trás quando passam. Mas o sobrepastoreio - que ocorre quando a grama é excessivamente consumida por grandes herbívoros - e a compactação - causada pelo pisoteio constante de grandes herbívoros sem a presença de seus predadores felinos para orientar o movimento migratório dos rebanhos - estão abrindo fendas e desertos na vegetação.
As versões mais aceitas falam das causas naturais da desertificação, mas como observador dos desertos que estão se formando no Brasil devido ao mau manejo da terra por atividades agrícolas em larga escala e sabendo que os fenômenos são complexos e não têm causas definitivas e isoladas, acredito em pesquisadores como o arqueólogo David Wright, que afirma que o efeito albedo causado pela exposição do solo foi fundamental na desertificação do Saara há 8 mil anos.
Hoje já existem técnicas de pastoreio e criação de animais, resultado da observação de sistemas naturais, que conseguem atingir um equilíbrio satisfatório para aumentar a biomassa verde total do sistema e a cobertura vegetal, em vez de diminuí-la e desertificá-la. Mesmo assim, é comum ver pastagens nuas e solo duro por aí, onde a água não consegue penetrar e o solo se recarrega. Nesses lugares, também, a vida é difícil e os seres humanos não conseguem se desenvolver. Ou, quando conseguem, é à custa de muitos insumos externos e do desperdício de água em um processo destrutivo oculto com um balanço energético negativo que o proprietário da empresa se recusa a observar.
Esses são os sistemas e seu delicado equilíbrio. A ação humana predatória, como as galinhas no início deste artigo, pode criar problemas para os sistemas naturais e humanos, causando destruição. Mas quando os seres humanos observam a perfeição dos sistemas naturais e interagem para incentivar o feedback, eles podem contribuir para aumentar a abundância deste paraíso terrestre.
Artigo escrito por: Marina Utsch
Instagram: instagram.com/marinautsch.official
Linkedin: linkedin.com/in/marina-utsch





Comentários