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Foto aérea da cidade de Belém. Foto de Fernando Frazão
Belém precisa mais do que dobrar o número de leitos de hotel para a COP30
Rede hoteleira espera aumentar de 18 mil para 50 mil vagas
BRUNO DE FREITAS MOURA - REPÓRTER DA AGÊNCIA BRASIL
Publicado em 05/01/2025 Agência Brasil - 11:32
Rio de Janeiro
Construído nos estilos art nouveau e neoclássico, o Mercado de São Brás foi reinaugurado em Belém, no Pará. O prédio histórico abriga mais de 300 mercados e lojas que vendem alimentos, ervas, artesanato e roupas. A restauração do local é a primeira de uma série de intervenções que serão concluídas na cidade nos próximos meses.
Belém está se preparando para sediar a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), que ocorrerá de 10 a 21 de novembro de 2025. A conferência é um importante encontro internacional para discutir o meio ambiente e as decisões para ajudar a conter o aquecimento global, que causa mudanças climáticas e desastres ambientais.
Canteiros de obras, tapumes, intervenções no trânsito e placas com a inscrição “Capital da COP30” podem ser vistos por toda a cidade.
“São mais de 30 projetos estruturais em andamento em Belém, realizados pelo governo federal em conjunto com a prefeitura e o governo do estado do Pará. Os investimentos têm uma razão e um significado. Estamos fornecendo infraestrutura para uma cidade maravilhosa que terá um grande legado”, disse Valter Correia, secretário extraordinário da COP30.
Vinculada à Casa Civil da Presidência da República, a Secretaria Extraordinária da COP-30 foi criada pelo governo em março de 2024 para coordenar a preparação da Amazônia para sediar a COP30.
Expansão do hotel
No entanto, para dar conta da magnitude da conferência, que deverá receber mais de 60 mil pessoas, entre chefes de Estado, diplomatas, empresários, investidores, ativistas, jornalistas e delegações dos 193 países membros, um setor terá de enfrentar o desafio de mais que dobrar de tamanho: a hotelaria.
“O setor hoteleiro de Belém está em plena atividade. Todos os hotéis estão passando por reformas para atender à COP30”, disse o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do Pará (ABIH-PA), Antônio Santiago, em entrevista à Agência Brasil.
“O principal desafio ainda é aumentar o número de leitos existentes”, disse o presidente da ABIH-PA, que espera receber 40 mil visitantes na cidade.
Santiago disse que a capital tem atualmente 18 mil leitos de hotel e espera chegar à COP30 com entre 45 mil e 50 mil, sendo que uma cama de casal conta como dois leitos.
De acordo com Santiago, com a abertura dos hotéis, o número de leitos deve chegar a 22.000. Belém ganhará três hotéis de alto padrão, construídos por grupos internacionais para o público A e B. Um deles ficará no Porto de Belém. Um deles ficará na área do Porto Futuro II, outro em um antigo prédio que pertenceu à Receita Federal e o terceiro em Castanhal, fora da capital, mas na região metropolitana.
Alternativas
Estão em andamento negociações com plataformas virtuais como Airbnb e Booking para registrar propriedades e aumentar a oferta de quartos disponíveis para o período da COP30. Além disso, dois transatlânticos servirão como hotéis flutuantes com 5.000 leitos.
Dezessete escolas públicas serão transformadas pelo governo do Pará em albergues temporários. “Com tudo isso, esperamos chegar a mais 22.000 leitos”, disse Santiago. Atualmente, cerca de 2.500 pessoas estão empregadas no setor. “Por COP30, esperamos contratar 40% mais trabalhadores”.
De acordo com o presidente da associação, as cidades vizinhas em um raio de 150 quilômetros também devem ter demanda por quartos de hotel.
De acordo com a Secretaria Extraordinária da COP30, R$ 224 milhões foram destinados pela estatal Itaipu para a construção da Vila Líderes, que oferecerá cerca de 500 quartos de padrão cinco estrelas. O alojamento atenderá parte das delegações e, após a COP30, o local funcionará como centro administrativo do governo estadual.
O governo federal também destinou R$ 100 milhões por meio do Fundo Geral de Turismo (recursos do Ministério do Turismo) para melhorar a qualidade dos hotéis e serviços turísticos.
O governo do Pará informou à Agência Brasil que incentivou a modernização da rede hoteleira ao isentar o setor do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) na compra de itens como frigobares, televisores, ar-condicionado e móveis.
Antônio Santiago, da ABIH-PA, projeta que a COP deixará para a rede hoteleira de Belém o legado de uma mão de obra mais preparada e novos empreendimentos hoteleiros de excelência.
Movimento
A COP30 será realizada em novembro de 2025, mas Belém e seus hotéis já estão experimentando um aumento no movimento. De acordo com Santiago, desde o início do ano, a taxa de ocupação hoteleira da cidade subiu de 50% para 82%, em média.
No dia 15 de dezembro, o ministro do Turismo, Celso Sabino, esteve no aeroporto de Belém para comemorar o recorde de 3,9 milhões de passageiros em 2024, cerca de 8% a mais do que no mesmo período de 2023.
De acordo com o ministério, o Aeroporto Internacional pode receber até 7,7 milhões de passageiros por ano, “cenário que, com as adaptações necessárias, proporcionará um atendimento satisfatório aos visitantes de Belém durante a COP30”.
Legado Urbano
As principais atividades da COP30 serão realizadas no Parque da Cidade e no Centro de Convenções Hangar, que estão conectados e localizados no bairro do Souza, a cerca de 20 minutos de carro do Aeroporto Internacional de Belém.
O Parque da Cidade ocupa o local de um antigo aeroporto e ainda está em construção, com cerca de 70% das obras concluídas. Após a conferência, o parque será entregue para uso da população. O projeto final inclui áreas verdes preservadas, um lago artificial, instalações esportivas, um museu de aviação, um centro de economia criativa e um boulevard gastronômico.
O investimento do governo federal nos preparativos para a Conferência de Mudanças Climáticas é de R$ 4,7 bilhões. As intervenções, realizadas em conjunto com as administrações estadual e municipal, visam à infraestrutura urbana, à segurança, à sustentabilidade, ao transporte e à mobilidade, como a conclusão do BRT Metropolitano (sistema de ônibus rápido em faixas exclusivas), o alargamento de vias e a construção de quatro viadutos.
A Rua da Marinha, na área da COP30, será ampliada de duas para seis pistas. “A obra beneficiará a população de seis bairros, desafogando o trânsito e melhorando a mobilidade”, diz nota enviada pelo governo do Pará.
Avaliação
A professora Roberta Menezes Rodrigues, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Pará (UFPA), acredita que qualquer investimento que a cidade venha a receber “tende a ser visto com bons olhos”.
“Belém é uma capital, mas é uma cidade que tem déficits enormes em termos de infraestrutura e qualidade de moradia. É uma cidade da região norte que sempre foi relegada a segundo plano em termos de investimento, especialmente na área de infraestrutura urbana”, disse ela.
A avaliação do professor sobre a situação habitacional de Belém é confirmada pelo Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que apontou Belém como a concentração urbana com maior proporção de habitantes vivendo em favelas (57,1%).
Rodrigues, que está participando de uma pesquisa financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) sobre o legado da COP30, acredita que ainda é cedo para ter clareza sobre o assunto.
“Falar de legado agora, na verdade, é falar de dúvidas”, afirma Rodrigues, que já vê uma contradição entre as intervenções que estão sendo feitas na cidade e os caminhos que deveriam ser seguidos justamente para alcançar o desenvolvimento ambiental sustentável.
“Por mais que tenhamos grandes investimentos acontecendo na cidade, parte deles ainda está atrelada a uma lógica de investimentos e formas de intervenção desse modelo que estamos questionando”, apontou.
“Estamos abrindo mais estradas e rodovias, desmatando as poucas áreas verdes que restam na cidade e priorizando, por exemplo, o transporte individual, o carro, em vez de priorizar o transporte público.”
O professor reconhece que a cidade ganhará ativos importantes em termos de infraestrutura, locais como o Parque da Cidade, e equipamentos culturais. “Belém nunca viu tanto investimento acontecendo ao mesmo tempo”, disse.
No entanto, ela adverte que algumas iniciativas podem favorecer o desenvolvimento imobiliário em determinadas áreas, em vez de beneficiar a população em geral. Em alguns casos, as pessoas chegaram a ser despejadas, diz ela, referindo-se às famílias que moravam na Avenida Tamandaré, onde está sendo construído o Parque Linear.
“É um tipo de investimento que está intimamente ligado ao desenvolvimento imobiliário.”
Legado ambiental
A professora Lise Vieira da Costa Tupiassu Merlin, do Instituto de Ciências Jurídicas da UFPA, destaca o fato de o mais importante evento internacional sobre meio ambiente ser realizado em uma cidade amazônica. “Atualmente, há um grande déficit de protagonismo da Amazônia nas discussões climáticas.”
“Embora o mundo inteiro reconheça a importância da Amazônia no combate às mudanças climáticas, as soluções e os debates são quase sempre moldados sem a participação de pessoas da região.”
Para a professora, Belém foi uma escolha apropriada para desempenhar esse papel de liderança porque “tem a maior instituição científica da Pan-Amazônia, a UFPA”. Ela também destacou o “conhecimento ancestral” da população local.
Tupiassu Merlin acrescentou que, por outro lado, Belém está localizada em “um estado que contém um grande mosaico de conflitos socioambientais, que contribuem para a intensificação das mudanças climáticas”.
Na opinião de Lise, o aumento do protagonismo depende de um posicionamento mais estratégico dos atores locais “mas também de uma vontade genuína por parte de outros atores de se abrirem para uma nova perspectiva de justiça climática”.
“A COP30 será, sem dúvida, uma oportunidade para isso, mas ainda há muito trabalho pela frente para garantir que essa oportunidade se transforme em benefícios duradouros para a população”, concluiu.
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